O debate sobre segurança pública exige compromisso com a transparência e com dados oficiais, sobretudo de quem já esteve no comando
Recentemente, o ex-comandante-geral da Polícia Militar de Sergipe, coronel Maurício Iunes, hoje comentarista de segurança pública na TV Atalaia, afirmou que a violência no estado teria aumentado. A declaração me surpreendeu e, diante dela, não basta reagir com concordância ou indignação: é preciso confrontar a fala com dados concretos.
A principal referência nacional sobre o tema, o Anuário Brasileiro de Segurança Pública, elaborado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, mostra um cenário muito diferente. Quando o coronel ocupou o comando da PM, Sergipe vivia um de seus períodos mais nebulosos quando o assunto era segurança pública: em 2014 e 2015, foram registradas 2.195 mortes violentas, com uma taxa de 53,3 homicídios por 100 mil habitantes, a pior do país à época. Apenas Aracaju concentrava quase tantas mortes quanto todo o estado registra atualmente.
O quadro se agravava com outros indicadores: explosões de agências bancárias eram recorrentes: foram 38 em 2013, 35 em 2014 e mais 27 em 2015, totalizando cerca de 100 casos em apenas três anos. Roubos e furtos de veículos somaram 5.892 ocorrências em apenas dois anos. A gestão também era marcada por dificuldades administrativas: o então secretário de Segurança Pública, Mendonça Prado, foi “atropelado” administrativamente pela falta de diálogo e integração com o comando da PM, o que fragilizava a coordenação das forças e, no fim, penalizava a população.
O Sergipe de hoje apresenta um contraste nítido, só não vê quem não quer. Em 2024, o estado registrou 365 homicídios, contra 451 em 2023 (muito distante dos mais de dois mil casos da gestão do então comandante), e a taxa caiu para 15,1 por 100 mil habitantes, menos de um terço da registrada em 2015. Há quatro anos não se registra sequer uma explosão de banco. Esses avanços não significam que todos os problemas foram resolvidos, mas indicam progresso consistente, sustentado por políticas de segurança integradas, investimento em inteligência e modernização tecnológica.
Esse comparativo revela um ponto essencial: a segurança pública não pode ser debatida com base apenas em percepções ou narrativas políticas. Os dados oficiais existem justamente para orientar diagnósticos, corrigir rotas e fortalecer a confiança da população nas instituições. Quando figuras com histórico de comando na área se manifestam, a responsabilidade com a precisão e a transparência é obrigatória.
A opinião é livre, mas, quando o assunto é segurança pública, o compromisso com os fatos precisa vir em primeiro lugar. Sem ele, o debate perde qualidade, a sociedade se desinforma e conquistas importantes correm o risco de serem invisibilizadas. Mais pragmatismo e responsabilidade não fazem mal a ninguém.
Artigo de Márlio Damasceno, assessor jurídico da ASPRA/SE (Associação de Praças Policiais e Bombeiros Militar de Sergipe), que também é radialista e jornalista, para o blog Espaço Militar
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